quarta-feira, 30 de janeiro de 2008

Anexo, mais um artigo de (des)Artes & Textos


Construção

Quando falamos de construção, sempre nos vem à mente segurança, fortaleza, resistência, conforto. O pressuposto é que se constrói para durar.

Apresentam-se como exemplo clássico de construção que eternizou o conceito de resistência e durabilidade as Pirâmides do Vale do Nilo. Quando a referência é segurança, logo nos deparamos com as Muralhas da China. O conforto nos leva aos Jardins Suspensos da Babilônia.

Pode-se ter construção em toda a sua essência numa simples e frágil casca de ovoobra perfeita de anônimo arquiteto. Esta, por sua concepção, leveza de linhas e formas, merece o melhor dos Nyemeiers. E a finalidade? Preservar a espécie, objetivo muito mais pleno de méritos que servir de túmulo a um faraó qualquer.

O João-de-barro constrói seu confortável lar com lama colhida a conta-gotas, situando-o numa paisagem exuberante, sobre os galhos de frondosa árvore. Lá, velado de olhares indiscretos, recebe a sua amada.

Qual a mais tenra das construções!? Os simples e frágeis favos de mel, construídos meticulosamente pelas abelhas com a seiva de suas próprias entranhas. Neles, apesar da fragilidade, armazenam-se alimento suficiente para todos os habitantes da colmeia.

Existe construção mais singela do que bolhas de sabão a voar em ziguezague, uma após outra!? Uma cumbuca com espuma, um canudinho de caule de mamona, um sopro dado com delicadeza e eis uma criança-arquiteto a criar mundos coloridos, repletos de sonhos e fantasia.

Façamos de nosso cérebro uma fonte construtiva e marcaremos nossa passagem pela vida com o traço indelével da sabedoria.

Juracy de Oliveira Paixão ( Maio de 2004)

quarta-feira, 16 de janeiro de 2008

Mais um artigo de (des)Artes & Textos:


Encruzilhada

O menino foi dormir cedo. Programou, para o dia seguinte, caminhar até a fazenda de seus avós, a ver as cajazeiras, cajueiros, criações..., tias e tios. O caminho, velho conhecido, era estreito, com fofa areia e mato fechado nas laterais: duas léguas de firme caminhada, nelas incluídas as duas ladeiras e o velho rio.

Do batido caminho da roça, o que o menino mais apreciava era cruzar o rio que, de tão pouca água, chamava-se Seco. Havia chovido por duas semanas inteiras. “Tomara que dê vau”, pensou o menino. Não sabia nadar e não achava nenhuma graça em utilizar-se daquela tosca ponte de tora de jequitibá: “não sou equilibrista de circo pra andar nesse trapézio...”.

Assobiando, o menino não viu o tempo passar. Na altura da primeira légua, deu de brusco com a temida – embora tantas vezes cortada – encruzilhada. O senho fechou-se, a lembrar do que aprendera com seus antigos: “o caipora entoca-se nas encruzilhadas para cobrar pedágio dos incautos passantes. Um naco de fumo de corda é o preço para não ser transformado em lobisomem”; “onde os caminhos se cruzam, armam-se os despachos contra alma penada. Pisar em um deles é aleijão na certa”; “ao chegar a uma encruzilhada, não se deve sair da rota. Do contrário, fica-se rodopiando à toa”.

Tudo lhe veio à mente em um segundo. Suava a cântaros. Estacou. Além do medo, havia a interrogação: “onde irão dar essas trilhas laterais!?” Sentou-se num galho seco a pensar. O suor lavou o medo e fermentou a curiosidade. Tudo à flor da pele. Procurou pelo caipora, vasculhou o chão de areia para se livrar dos despachos e não viu nada além de mato.

Aventurou-se. Enveredando pela trilha da direita, andados um bom quarto de légua, deu de cara com uma cerca farpada, com passadiço. Adiante avistou um sítio com terreiro de galinhas e um chiqueiro. A vereda terminava ali, sem saída avante.


Retornou. Enfiou-se pela esquerda a passos largos, voltando os olhos. Batida uma boa meia hora, encontra-se no topo de uma ribanceira. A vereda seguia para baixo, aos ziguezagues. Quase agachado, o menino desceu a rampa e, numa curva do íngreme caminho, avistou lá embaixo o velho e querido rio de águas turvas. Sorriu e falou para si mesmo: “ganhei bem uma meia légua...”. Estava a um pulo do seu destino.

A partir daquele dia de descobertas, a encruzilhada e seus fantasmas deixaram de existir para o menino.

Fazemos nossa trajetória de vida esbarrando em seguidas encruzilhadas. Podemos, por temor dos riscos, buscar o caminho mais fácil, aquele já por muitos percorridos. Nada de novo haveremos de acrescentar. Enfrentar o desconhecido é viver a emoção de perder com esforço ou ganhar com louvor e sabedoria.

Afinal, o Conhecimento é fruto sadio tanto dos acertos como dos erros.

Juracy de Oliveira Paixão ( Abril de 2004).

terça-feira, 8 de janeiro de 2008

Justiça – Noção histórica e social

Ao afirmar-se que a JUSTIÇA é natural, dá-se a esta uma característica de imutabilidade, com alicerce no conceito de que O HOMEM É BOM, É JUSTO, É HONESTO. Ignoram-se os fatores laterais que influem, de fato, na ação do homem e do que ele representa: a sociedade, o modo de produção (no conceito marxista de forma organizacional em determinado tempo e espaço), as ações entre os indivíduos e as camadas sociais a que esses pertencem.

Ao longo do tempo e desde os mais remotos tempos, os conceitos de justiça têm variado em função de fatores não naturais - os sociais e econômicos - determinados pelas condições existentes em cada época e atrelados aos estágios de civilização e organização de cada etapa histórica.

Seja analisando o Código de Hamurabi, as normas ditadas por José ao Faraó ou, mesmo, o Código Soviético, vamos encontrar fenômenos que relatarão as ocorrências históricas e sociais de cada instante em que tais instrumentos foram lançados ao uso.

As correlações de fatores sociais, econômicos, ideológicos e cognitivos de cada estágio histórico ditam os procedimentos que serão “legalizados” pela sociedade – ou pelo poder reinante – como os válidos para a pronta e justa aplicação.

A Justiça é, antes de tudo, uma noção social e histórica.


Juracy de Oliveira Paixão
Maio de 1996

quarta-feira, 2 de janeiro de 2008

Caros amigos,


Na minha ânsia de remeter o texto, esqueci de anexar a figura de "Domínio, o Bom e o Mau".

Vejam-na:


Caros amigos,
Em homenagem ao novo ano que se incia, anexo um artigo de (Des)Artes & Textos com espírito ecológico. Afinal, mesmo comemorando o Ano Novo, temos que lamentar a desgraça ambiental.
Juracy Paixão


Domínio, o Bom e o Mau

No Princípio não era o verbo, mas a Escuridão. Sua morada, o Espaço, era vazia e não tinha sentido. Um dia surgiu o SOL a dominar o vazio, iluminando a Escuridão com seus Raios Amarelos.

O Sol deu-se o nome de Astro Rei. Seu Calor fez surgir a Esfera Azul, cheia de água, onde logo vicejou o Verde, originando o que se convencionou chamar de Paisagem. Em pouco tempo, Paisagem passaria a ser apelidada de Meio Ambiente, razão de ser da Esfera Azul, que ganhou o sobrenome de Planeta Terra.

Dos miasmas e fermentações sob o Verde surgiram os Animais, com sua Seiva Rubra. Alguns desses Animais, com inveja do Astro Rei e desejosos de exercer domínio sobre os outros à sua volta, perderam a inteligência e se tornaram Seres Humanos.

Os Seres Humanos guerrearam entre si, aprenderam a se comunicar - depois deixaram de o fazer - e chegaram ao Futuro. No Futuro, dividiram-se em dois grupos: Os Desprovidos de Bom Senso e Os que Raciocinam com Lógica. Esses últimos conseguiram manter, apesar da oposição dos primeiros, alguma inteligência do tempo em que eram simplesmente Animais.

Os Desprovidos de Bom Senso, julgando-se senhores do Verde e da Paisagem e incentivados por uma doença chamada Ganância, cuidaram de derrubar tudo, atear fogo, emitir gases poluentes, sujar bastante, criando assim o Marrom, apelido de Paisagem Arrasada.

Paisagem Arrasada é tão poderosa que invade o que resta do Verde e tenta escurecer o Amarelo resplandecente do Sol. Este, ofendido em seus brios e em seu brilho (que parece estar com os dias contados), resiste, faz revigorar a Esfera Azul e estimula a Seiva RubraOs que Raciocinam com Lógica, dando-lhes força para enfrentar Os Desprovidos de Bom Senso.

Quem vencerá esta peleja, se morrer o Verde e vier a se apagar o Amarelo resplandecente do Sol ??!!

Conseguirão Os que Raciocinam com Lógica salvar a razão de ser da Esfera Azul !!??

Juracy de Oliveira Paixão (Abril de 2003).