quarta-feira, 12 de novembro de 2008

(des)Artes & Textos estava de férias. Agora retorna com todas as energias...

Pontos de Vista
Os fatos acontecem ao nosso redor. Vemos esses fatos conforme as influências que eles exerçam sobre nossa capacidade de percepção.

Uma posição política sectária nos fará vislumbrar as mudanças sociais sobre uma ótica limitada, obtusa mesmo, que não oferece possibilidades de concessão e de ganhos.

Uma base de conhecimento restrita nos leva a deixar de enxergar novas visões do mundo, muito mais abrangentes do que aquelas limitadas pela nossa ignorância.

A intransigência e extravagância religiosa nos conduzem para regras fixas de pensar e agir, eliminando o lado criativo do ser humano na busca do bem estar e do conhecimento.

O que é certo e o que é errado !!??

Aquilo que me parece correto, sob o meu ponto de vista, com os dogmas e regras que me determinei - ou que me foram determinados -, impede-me de ver nos acertos dos outros, aspectos positivos. Terei, então, uma vida limitada por mim mesmo - ou por quem me impõe limites.

O que me parece errado, sob o meu ponto de vista, barra minha capacidade de ser tolerante, não me deixando perceber no que julgo ser erros dos outros, acertos grandiosos que, se agregados ao meu conhecimento, abrir-me-iam novas perspectivas.

Na maioria das vezes, nosso ponto de vista está à direita ou à esquerda da lógica. Não que a lógica deva ser a regra, mas porque funciona como um sinalizador. O ponto de vista rígido é como uma mancha branca em meio ao colorido das idéias.

Afinal, o que somos!!?? Resultamos das influências ou as exercemos?

O ser humano nasce dotado de todas as ferramentas para seu pleno e permanente aperfeiçoamento. Devemos aprender a utilizar essas ferramentas com sabedoria, equilibrio, constância e isenção.

Fazer de um ponto de vista uma norma é negar a condição humana.

Juracy de Oliveira Paixão ( Novembro de 2002).

terça-feira, 14 de outubro de 2008

Pessoal,
Fui submetido a uma cirurgia, mas não deixei de besteirar.

Plágio, pero no mucho

Juracy de Oliveira Paixão
29 de setembro de 2008

Se coco não fosse duro, Não havia gente banguela.

A segurança da noite, Reside no sentinela.

Comesse sopa esfriada, Para que serviria tigela?

Gorducho seria feio, Se não houvesse magrela?

Como há muito ladrão, Toda porta tem tramela.

Nada melhor num cortiço, Do que uma boa lambidela.

Uma boa noite de sono, É marcada por remela.

Festa de aniversário só presta, Com briga de parentela.

Quero ver porco baé, Comer fora de gamela?

Eu bebo cachaça com cravo, Mas prefiro com canela.

O gado só fica no pasto, Por causa de uma cancela.

Quem não prefere cajá, No lugar de siriguela?

Toda cidade antiga, Tem ruela e viela.

Pra namorar não tem ponto, Melhor que fundo de capela.

Se comida fosse só crua, Fogo não via panela.

Prámontador de cangalha, Tudo lembra uma boa sela.

Para furar couro curtido, Só mesmo forte sovela.

Ah, como é difícil nas ruas, Se livrar de cuspidela!

Não conheço família grande, Onde não haja querela;

Fazer negócio mal feito, É cair em esparrela.

Nada melhor prá limpeza, Do que uma boa flanela.

Todo cavalo de raça, Gosta de uma escovadela.

Como tirar água de poço, Se o dito não tiver biela?

Por que casarão antigo Sempre tem parede amarela?

Namorar na porta de casa, Só serve prá apalpadela;

Na boca da noite, vizinha Só fofoca na janela.

Toda venda de interior, Só anda com clientela;

Já pensou em andar na roça, Por caminho que não tem portela?

Quem disse que só tem bandido, Onde existe favela?

Carne de carneiro é macia, Mas prefiro de vitela.

Dizem que roupa pra ser boa, Tem que ter larga ourela.

O que é que é mais franzino? Um veado ou uma gazela?

Conversa de marido e mulher, Ou se cala ou se revela.

Não tem incômodo pior, Do que pimenta na goela.

Toda rua de cidadezinha, Merecia uma aquarela.

Dizem que cão que ladra não morde. E se for uma cadela?

Pobre quando vende seus bens, Sempre é por bagatela;

É melhor a vila de hoje, Ou a outrora cidadela?

Ah, se as plantas pudessem, Se livrar da pisadela!

Prá acordar bêbado dormindo, Só vai de sacudidela.

De que adianta um belo cinto, Se não tiver boa fivela?

Tudo indica que a morte é feia, Mas a vida é sempre bela?

Quando se ama de verdade, Toda moça é Cinderela.

Viu piscar mulher dos outros? É seguro não dar trela.

Quem bem tem um grande amor, Por se só segura e zela.

Meu domingo só é alegre, Quando passeio eu e ela.

Papai, mamãe, Que moça bonita é aquela!?

quinta-feira, 11 de setembro de 2008

des)Artes & Textos

"Pedras no meio do caminho"

Nascemos. Logo partimos em caminhada. A trilha está marcada em solo arenoso, cercado pelo desconhecido. O horizonte, destino pretendido, vamos definindo à medida que o caminho avança e em função dos obstáculos a superar. Esses - pedras no meio do caminho – tanto podem sugerir uma grande e intransponível barreira a exigir penoso atalho, como indicar o sacrifício da meta pretendida em favor de opções duvidosas. Tudo dependerá da audácia e da perseverança do andarilho.

Alcançar a vitória não significa, necessariamente, chegar ao destino antes traçado. Reside, também, em não se deixar abater pelas pedras no meio do caminho, mas em moldar o alcance do objetivo em função das dificuldades. Afinal, as pedras estão ali justamente para testar a persistência e a perspicácia de quem avança.

Certamente, ao longo da rota surgirão desvios que impressionam e empolgam, a sugerir deleite e aventura. É preciso ser decidido, forte e coerente para resistir à atração desses tentadores desvios e conduzir-se pelo duro atalho pleno de dúvidas, incertezas e sacrifícios.

O desvio que encanta e dissimula é o divisor de águas. Cabe ao andarilho optar pelo difícil que o conduzirá ao horizonte pretendido, ou deixar-se impressionar pelo fácil e agradável e alcançar o nada.

Forjar a vida consiste em saber recompor-se a cada revês, reestruturar as ações em função das agruras sofridas e, como barro novo após cada enxurrada, encontrar a razão de ser dentro de inesperado amálgama.

Dizem os teóricos de superfície que queimar etapas buscando desvios é a forma mais eficiente de se obter resultados. Mas, como fica o aperfeiçoamento que decorre, justamente, do erro e do acerto!?

Juracy de Oliveira Paixão (Setembro de 2004).

quarta-feira, 3 de setembro de 2008

(des)Artes & Textos

Frágil, porém Forte

Habituamo-nos a considerar que "a resistência está para o aço, assim como a fragilidade está para o vidro". À luz do interior próprio dos materiais, não há dúvidas quanto ao suporte científico da comparação. O que nos cabe analizar, porém, são aspectos laterais, que envolvem o raciocínio.

Como reaje o ser humano ao sofrimento? Nem sempre os mais fortes fisicamente são os mais aptos a suportar a dor, ainda mais quando esta vem da tortura, que agride conceitos éticos e morais. É comum simples e sofridos presos políticos resistirem a meses de maus tratos sem trair seus contatos e objetivos, enquanto eventuais prisioneirostão somente suspeitosnutridos e bem situados, ao menor sopapo escancararem confissões impostas, “confirmando” fatos que lhes são inteiramente estranhos e desconhecidos apenas para se verem livres do suplício que lhes é aplicado.

É notório que as mulheres melhor resistem às crises depressivas e às dificuldades do que os homens, em que pese a aparência mais avantajada desses. Físico forte não é garantia de boa disposição e de capacidade de resistência.

O ser humano instala-se sobre alicerces que julga poderosos, até que os acontecimentos os abalem. Então, é preciso abrir janelas para consolidar uma nova estrutura. Abrir janelas implica em reconhecer fraquezas e admitir apoio.

Um simples pedregulho atirado pela funda do pequeno David atingiu o olho do gigante Golias e foi o bastante para lançá-lo ao chão.


Diante do temporal, há mais fortaleza nas frágeis asas da andorinha do que nos reforçados cascos dos barcos a navegar.

Juracy de Oliveira Paixão ( Fevereiro de 2003).







domingo, 3 de agosto de 2008

Caros amigos,

Nesses tempos de pré-eleição, nada melhor do que falar da falta de raciocínio.

Sigo, com meu (des)Artes & Textos:


Desraciocínio

O tão falado desenvolvimento tecnológico é resultado direto da evolução humana e da busca incessante pelo aperfeiçoar as cousas e as ações. A questão reside na aplicação equivocada desses esforços e seu mais nefasto exemplo está na acomodação da capacidade para raciocinar. Há quem chegue a dizer: ”Pensar para quê, se o computador faz tudo?” Outros, já desprovidos de qualquer dose de iniciativa, se limitam a afirmar: “Isso não pode ser feito, pois o sistema não aceita.”

O pensar como capacidade criativa foi substituído pela automação absoluta dos gestos, atos e fatos. Executa-se mecanicamente até as atitudes pessoais e os sentimentos mais íntimos como ternura, compreensão, dor, amor. Nada mais é feito por cada um e sim pelo sistema, através de códigos e exigências posturais preestabelecidas e por ações mecânicas e impessoais.

Combater o poderio dessa espécie de ditadura da tecnologia e do tal pensamento moderno constitui-se em ato subversivo, a merecer o castigo de diminutivos como: refratário a mudanças, retrógrado, conservador, ultrapassado.

As aplicações tecnológicas ignoram cultura, história, costumes, nacionalidade, patriotismo, até , esta combalida pela negação do velho bordão de que “somente Deus tudo pode”. Chegou, para Deus, a concorrência do computador.

Aqui, nesse brasil mal amado e de letras miúdas, a norma é avacalhar o idioma pátrio aportuguesando, para uso das massas ignorantes, os termos ditos superiores do inglês, na origem impronunciáveis pelos lábios, gargantas e línguas tupiniquins.

Nada mais certo do que se afirmar, inversa e categoricamente, que o hábito faz o monge.

Juracy de Oliveira Paixão (Dezembro de 2004).

domingo, 6 de julho de 2008

Caros amigos,
Voltando ao (des)Artes & Textos, aí vai mais uma.

da Vida... A Roda e o Cercado

Podemos comparar a nossa marcha, enquanto vivos, às quatro estações que delimitam as condições climáticas do ano.

Nosso nascer se assemelha à primavera, quando as plantas brotam e as flores se abrem, para alegria dos olhos. Na infância, ainda incrédulos diante das novidades e surpresas do mundo ao nosso redor, sorrimos transbordando alegria e mesmo o nosso eventual pranto cheira a satisfação.

Adolescentes, aprendemos a amar e a odiar, não admitimos sofrimento ou derrota, apostamos no futuro, por mais incerto que este nos pareça. Adultos, assumimos riscos e responsabilidades, dividimos nossas alegrias e realizações com parceiros e parceiras que julgamos perfeitos, em que pesem as decepções eventuais. Quando acertamos, vivemos a satisfação plena que somente o calor do afeto e da lealdade permite. Estamos em pleno verão.

Logo, como um soprar de ventania, descobrimos que existe a frustração, o sofrimento, a derrota. A necessidade de apoio torna-se uma constante, ainda que seja para seguirmos na trilha. As perdas ao nosso redor diminuem nossa aposta no futuro, antes tão promissor. Sofremos quedas inesperadas, desiludimo-nos com alguns dos que julgávamos parte de nós e nos agasalhamos. É o outono que nos bafeja.

O frio que nos invade a alma aponta a chegada do inverno, marcando, com seu cajado, o término da jornada. O que, um dia, nos parecia remoto, bate à nossa porta e nos transporta para o desconhecido.

A vida é uma roda que gira incessantemente, mas o fim certo indica que esse giro, tão ansiosamente praticado, se dá, sempre, dentro de um cercado sem saídas.

Juracy de Oliveira Paixão (Fevereiro de 2004).


quarta-feira, 30 de abril de 2008

Caros amigos,
Hoje quero dedicar meu espaço a um dos maiores compositores do Brasil: o paraibano Jessier Quirino. Este cara é capaz de transformar as coisas mais simples em clássicos. Dele, o que mais admiro é a composição "Vou-me embora pro passado", cuja letra encontrei em forma de texto na Internet. Remeto-a para vocês, abaixo. Comprem o CD (nada de pirataria, viu gente...)dele e vão adorar.

Vou-me embora pro passado

Jessier Quirino

Vou-me embora pro passado. Lá sou amigo do rei. Lá tem coisas "daqui, ó!":Roy Rogers, Buc Jones, Rock Lane, Dóris Day. Vou-me embora pro passado.

Vou-me embora pro passado porque lá é outro astral. Lá tem carros Vemaguet, Jeep Willys, Maverick. Tem Gordine, tem Buick, tem Candango e tem Rural. Lá dançarei Twist, Hully-Gully, Iê-iê-iê. Lá é uma brasa mora! Só você vendo pra crer. Assistirei Rim Tim Tim, ou mesmo Jinnie é um Gênio. Vestirei calças de Nycron, Faroeste ou Durabem, tecidos sanforizados, Tergal, Percal e Banlon. Verei lances de anágua, combinação, califon. Escutarei Al Di Lá, Dominiqui Niqui Niqui. Me fartarei de Grapette na farra dos piqueniques. Vou-me embora pro passado.

No passado tem Jerônimo, aquele Herói do Sertão. Tem Coronel Ludugero, com Otrope em discussão. Tem passeio de Lambreta, de Vespa, de Berlineta, Marinete e Lotação. Quando toca Pata Pata, cantam a versão musical "Tá Com a Pulga na Cueca" e dançam a música sapeca “Ô Papa Hum Mau Mau”. Tem a turma prafrentex cantando “Banho de Lua”. Tem bundeira e piniqueira dando sopa pela rua. Vou-me embora pro passado.

Vou-me embora pro passado que o passado é bom demais! Lá tem meninas "quebrando" ao cruzar com um rapaz. Elas cheiram a Pó de Arroz da Cachemere Bouquet, Coty ou Royal Briar. Colocam Rouge e Laquê, English Lavanda Atkinsons ou Helena Rubinstein. Saem de saia plissada ou de vestido tubinho com jeitinho encabulado, flertando bem de fininho. E lá no cinema Rex, se vê broto a namorar de mão dada com o guri, com vestido de organdi, com gola de tafetá.

Os homens lá do passado só andam tudo tinindo: de linho Diagonal, camisas Lunfor, a tal; sapato Clark de cromo ou Passo-Doble esportivo, ou Fox do bico fino; de camisas Volta ao Mundo, caneta Shafers no bolso, ou Parker 51; só cheirando a Áqua Velva, a sabonete Gessy, ou Lifebouy, Eucalol. E junto com o espelhinho, pente Pantera ou Flamengo e uma trunfinha no quengo, cintilante como o sol.

Vou-me embora pro passado. Lá tem tudo que há de bom! Os mais velhos inda usam sapatos branco e marrom E chapéu de aba larga Ramenzone ou Cury Luxo. ouvindo “Besame Mucho”, solfejando a meio tom.

No passado é outra história! Outra civilização... Tem Alvarenga e Ranchinho, tem Jararaca e Ratinho aprontando a gozação. Tem assustado à Vermuth, ao som de Valdir Calmon. Tem Long-Play da Mocambo, mas Rosenblit é o bom. Tem Albertinho Limonta, tem também Mamãe Dolores. Marcelino Pão e Vinho. Tem Bat Masterson, tem Lessie, Túnel do Tempo, tem Zorro. Não se vê tantos horrores.

Lá no passado tem corso, Lança perfume Rodouro, Geladeira Kelvinator. Tem rádio com olho mágico, ABC a voz de ouro. Se ouve Carlos Galhardo em audições musicais. Piano ao cair da tarde. Cancioneiro de Sucesso. Tem também Repórter Esso com notícias atuais.Tem petisqueiro e bufê junto à mesa de jantar. Tem bisqüit e bibelô, tem louça de toda cor, bule de ágata, alguidar. Se brinca de cabra cega, de drama, de garrafão, Camoniboi, balinheira, de rolimã na ladeira, de rasteira e de pinhão. Lá, também tem radiola de madeira e baquelita. Lá se faz caligrafia pra modelar a escrita. Se estuda a tabuada de Teobaldo Miranda ou na Cartilha do Povo, lendo “Vovô Viu o Ovo” e a palmatória é quem manda.

Tem na revista "O Cruzeiro" a beleza feminina. Tem misse botando banca com seu maiô de elanca, o famoso Catalina. Tem cigarros Yolanda, Continental e Astória. Tem o Conga Sete Vidas, Tem brilhantina Glostora, Escovas Tek, Frisante, Relógio Eterna Matic com 24 rubis, pontual a toda hora. Se ouve página sonora na voz de Ângela Maria: "— Será que sou feia? — Não é não senhor! — Então eu sou linda? — Você é um amor!..."

Quando não querem a paquera, mulheres falam: "Passando, que é pra não enganchar!" "Achou ruim dê um jeitim!" "Pise na flor e amasse!" E AI e POFE! e quizila. Mas o homem não cochila, passa o pano com o olhar, Se ela toma Postafen, que é pra bunda aumentar, ele empina o polegar, faz sinal de "tudo X" e sai dizendo "Ô Maré!”, todo boy, mancando o pé, Insistindo em conquistar.
No passado tem remédio pra quando se precisar. Lá tem doutor de família que tem prazer de curar. Lá tem Água Rubinat, Mel Poejo e Asmapan, Bromil e Capivarol. Arnica, Phimatosan, Regulador Xavier. Tem Saúde da Mulher, tem Aguardente Alemã, tem também Capiloton, Pentid e Terebentina. Xarope de Limão Brabo, Pílulas de Vida do Dr. Ross. Tem também, aqui pra nós, uma tal Robusterina, a saúde feminina.

Vou-me embora pro passado, pra não viver sufocado, pra não morrer poluído, pra não morar enjaulado. Lá não se vê violência, nem droga nem tanto mal. Não se vê tanto barulho, nem asfalto, nem entulho. No passado é outro astral. Se eu tiver qualquer saudade, escreverei pro presente, e quando eu estiver cansado da jornada, do batente, terei uma cama Patente, daquelas do selo azul, num quarto calmo e seguro, onde ali descansarei. Lá sou amigo do rei. Lá, tem muito mais futuro. Vou-me embora pro passado

domingo, 20 de abril de 2008

Caroa amigos,





Incluo mais um artigo de (des)Artes & Textos





Tortura


Farpas e pontas sempre lembram dor. Dor lembrada é dor sentida.

Para quem escapa da morte como conseqüência da tortura, o sofrimento vitalício fica por conta da memória. Todas as agressões sofridas, todos os momentos de tensão – e de espera – tornam-se na lembrança a repetição psíquica do sofrimento físico passado.

A tortura tem a capacidade de perpetuar no torturado a pena que lhe foi imposta. Ao torturador basta o esquecimento dos atos praticados para que a ocorrência deixe de existir.

Mais hediondo do que furar, cortar, bater, pisar, é registrar na memória do ofendido cada agressão, de tal modo que ele se torna vítima e algoz de si mesmo.

O torturado que cala – não denuncia - sofre por si e pelo outro, já que o torturador, incapacitado de identificar pela denúncia forçada, nova vítima, põe na disponível a carga de sofrimento que reservou para a desconhecida, não denunciada.

Por que cala o torturado!!?? Porque há uma dor maior do que a física: a dor do desprezo, da fraqueza reconhecida.

Pode o torturado perdoar o torturador? Haverá de ser, se tal é possível, um perdão sempre repetido, a cada lembrança do sofrimento passado.

Pelo ato de torturar, o torturador – pretenso ser humano - mostra que está longe de alcançar o reino animal.

Juracy de Oliveira Paixão (Maio de 2003).

sábado, 1 de março de 2008

Seguindo em frente com (des) Artes & Textos:

O Saber e o Não Saber

Quando estamos certos do que sabemos costumamos afirmá-lo num tom que se caracteriza pela exclamação, em passado recente também conhecida como admiração. Admiração porque o Saber era motivo.

Ter certeza nos dá confiança e nos ajuda a superar obstáculos. É o Conhecimento ditando as regras, dispensando as crenças, eliminando os medos, reforçando a coragem.

Quando temos dúvidas sobre algo, quando nos aperta o mal-estar da incerteza, passamos a nos expressar de forma melancólica, deprimida, triste e interrogativa. Marchamos pelos caminhos da vida aos tropeços, procurando nos desviar de obstáculos por nós mesmos impostos, barreiras que o nosso inconsciente vacilante nos impõe como meio de nos proteger do desconhecido. As respostas que nos damos se limitam ao “quem sabe?”, ao “somente Deus pode ajudar...”, tudo sem convencimento, sem coerência.

Para vivermos com qualidade nos tempos hodiernos, precisamos encontrar respostas coerentes para as nossas dúvidas, temos que ancorar a interrogação na força da exclamação, devemos saltar os obstáculos impostos pelo inconsciente e Conhecer.

A vida somente será plena quando as nossas respostas forem mais freqüentes que as nossas perguntas, embora estas sempre se façam presentes, a alimentar a ânsia e a necessidade do Saber.

A Dúvida está para a fragilidade do Vidro assim como a Certeza está para a resistência do Aço.

Juracy de Oliveira Paixão (Maio de 2003).

quarta-feira, 30 de janeiro de 2008

Anexo, mais um artigo de (des)Artes & Textos


Construção

Quando falamos de construção, sempre nos vem à mente segurança, fortaleza, resistência, conforto. O pressuposto é que se constrói para durar.

Apresentam-se como exemplo clássico de construção que eternizou o conceito de resistência e durabilidade as Pirâmides do Vale do Nilo. Quando a referência é segurança, logo nos deparamos com as Muralhas da China. O conforto nos leva aos Jardins Suspensos da Babilônia.

Pode-se ter construção em toda a sua essência numa simples e frágil casca de ovoobra perfeita de anônimo arquiteto. Esta, por sua concepção, leveza de linhas e formas, merece o melhor dos Nyemeiers. E a finalidade? Preservar a espécie, objetivo muito mais pleno de méritos que servir de túmulo a um faraó qualquer.

O João-de-barro constrói seu confortável lar com lama colhida a conta-gotas, situando-o numa paisagem exuberante, sobre os galhos de frondosa árvore. Lá, velado de olhares indiscretos, recebe a sua amada.

Qual a mais tenra das construções!? Os simples e frágeis favos de mel, construídos meticulosamente pelas abelhas com a seiva de suas próprias entranhas. Neles, apesar da fragilidade, armazenam-se alimento suficiente para todos os habitantes da colmeia.

Existe construção mais singela do que bolhas de sabão a voar em ziguezague, uma após outra!? Uma cumbuca com espuma, um canudinho de caule de mamona, um sopro dado com delicadeza e eis uma criança-arquiteto a criar mundos coloridos, repletos de sonhos e fantasia.

Façamos de nosso cérebro uma fonte construtiva e marcaremos nossa passagem pela vida com o traço indelével da sabedoria.

Juracy de Oliveira Paixão ( Maio de 2004)

quarta-feira, 16 de janeiro de 2008

Mais um artigo de (des)Artes & Textos:


Encruzilhada

O menino foi dormir cedo. Programou, para o dia seguinte, caminhar até a fazenda de seus avós, a ver as cajazeiras, cajueiros, criações..., tias e tios. O caminho, velho conhecido, era estreito, com fofa areia e mato fechado nas laterais: duas léguas de firme caminhada, nelas incluídas as duas ladeiras e o velho rio.

Do batido caminho da roça, o que o menino mais apreciava era cruzar o rio que, de tão pouca água, chamava-se Seco. Havia chovido por duas semanas inteiras. “Tomara que dê vau”, pensou o menino. Não sabia nadar e não achava nenhuma graça em utilizar-se daquela tosca ponte de tora de jequitibá: “não sou equilibrista de circo pra andar nesse trapézio...”.

Assobiando, o menino não viu o tempo passar. Na altura da primeira légua, deu de brusco com a temida – embora tantas vezes cortada – encruzilhada. O senho fechou-se, a lembrar do que aprendera com seus antigos: “o caipora entoca-se nas encruzilhadas para cobrar pedágio dos incautos passantes. Um naco de fumo de corda é o preço para não ser transformado em lobisomem”; “onde os caminhos se cruzam, armam-se os despachos contra alma penada. Pisar em um deles é aleijão na certa”; “ao chegar a uma encruzilhada, não se deve sair da rota. Do contrário, fica-se rodopiando à toa”.

Tudo lhe veio à mente em um segundo. Suava a cântaros. Estacou. Além do medo, havia a interrogação: “onde irão dar essas trilhas laterais!?” Sentou-se num galho seco a pensar. O suor lavou o medo e fermentou a curiosidade. Tudo à flor da pele. Procurou pelo caipora, vasculhou o chão de areia para se livrar dos despachos e não viu nada além de mato.

Aventurou-se. Enveredando pela trilha da direita, andados um bom quarto de légua, deu de cara com uma cerca farpada, com passadiço. Adiante avistou um sítio com terreiro de galinhas e um chiqueiro. A vereda terminava ali, sem saída avante.


Retornou. Enfiou-se pela esquerda a passos largos, voltando os olhos. Batida uma boa meia hora, encontra-se no topo de uma ribanceira. A vereda seguia para baixo, aos ziguezagues. Quase agachado, o menino desceu a rampa e, numa curva do íngreme caminho, avistou lá embaixo o velho e querido rio de águas turvas. Sorriu e falou para si mesmo: “ganhei bem uma meia légua...”. Estava a um pulo do seu destino.

A partir daquele dia de descobertas, a encruzilhada e seus fantasmas deixaram de existir para o menino.

Fazemos nossa trajetória de vida esbarrando em seguidas encruzilhadas. Podemos, por temor dos riscos, buscar o caminho mais fácil, aquele já por muitos percorridos. Nada de novo haveremos de acrescentar. Enfrentar o desconhecido é viver a emoção de perder com esforço ou ganhar com louvor e sabedoria.

Afinal, o Conhecimento é fruto sadio tanto dos acertos como dos erros.

Juracy de Oliveira Paixão ( Abril de 2004).

terça-feira, 8 de janeiro de 2008

Justiça – Noção histórica e social

Ao afirmar-se que a JUSTIÇA é natural, dá-se a esta uma característica de imutabilidade, com alicerce no conceito de que O HOMEM É BOM, É JUSTO, É HONESTO. Ignoram-se os fatores laterais que influem, de fato, na ação do homem e do que ele representa: a sociedade, o modo de produção (no conceito marxista de forma organizacional em determinado tempo e espaço), as ações entre os indivíduos e as camadas sociais a que esses pertencem.

Ao longo do tempo e desde os mais remotos tempos, os conceitos de justiça têm variado em função de fatores não naturais - os sociais e econômicos - determinados pelas condições existentes em cada época e atrelados aos estágios de civilização e organização de cada etapa histórica.

Seja analisando o Código de Hamurabi, as normas ditadas por José ao Faraó ou, mesmo, o Código Soviético, vamos encontrar fenômenos que relatarão as ocorrências históricas e sociais de cada instante em que tais instrumentos foram lançados ao uso.

As correlações de fatores sociais, econômicos, ideológicos e cognitivos de cada estágio histórico ditam os procedimentos que serão “legalizados” pela sociedade – ou pelo poder reinante – como os válidos para a pronta e justa aplicação.

A Justiça é, antes de tudo, uma noção social e histórica.


Juracy de Oliveira Paixão
Maio de 1996

quarta-feira, 2 de janeiro de 2008

Caros amigos,


Na minha ânsia de remeter o texto, esqueci de anexar a figura de "Domínio, o Bom e o Mau".

Vejam-na:


Caros amigos,
Em homenagem ao novo ano que se incia, anexo um artigo de (Des)Artes & Textos com espírito ecológico. Afinal, mesmo comemorando o Ano Novo, temos que lamentar a desgraça ambiental.
Juracy Paixão


Domínio, o Bom e o Mau

No Princípio não era o verbo, mas a Escuridão. Sua morada, o Espaço, era vazia e não tinha sentido. Um dia surgiu o SOL a dominar o vazio, iluminando a Escuridão com seus Raios Amarelos.

O Sol deu-se o nome de Astro Rei. Seu Calor fez surgir a Esfera Azul, cheia de água, onde logo vicejou o Verde, originando o que se convencionou chamar de Paisagem. Em pouco tempo, Paisagem passaria a ser apelidada de Meio Ambiente, razão de ser da Esfera Azul, que ganhou o sobrenome de Planeta Terra.

Dos miasmas e fermentações sob o Verde surgiram os Animais, com sua Seiva Rubra. Alguns desses Animais, com inveja do Astro Rei e desejosos de exercer domínio sobre os outros à sua volta, perderam a inteligência e se tornaram Seres Humanos.

Os Seres Humanos guerrearam entre si, aprenderam a se comunicar - depois deixaram de o fazer - e chegaram ao Futuro. No Futuro, dividiram-se em dois grupos: Os Desprovidos de Bom Senso e Os que Raciocinam com Lógica. Esses últimos conseguiram manter, apesar da oposição dos primeiros, alguma inteligência do tempo em que eram simplesmente Animais.

Os Desprovidos de Bom Senso, julgando-se senhores do Verde e da Paisagem e incentivados por uma doença chamada Ganância, cuidaram de derrubar tudo, atear fogo, emitir gases poluentes, sujar bastante, criando assim o Marrom, apelido de Paisagem Arrasada.

Paisagem Arrasada é tão poderosa que invade o que resta do Verde e tenta escurecer o Amarelo resplandecente do Sol. Este, ofendido em seus brios e em seu brilho (que parece estar com os dias contados), resiste, faz revigorar a Esfera Azul e estimula a Seiva RubraOs que Raciocinam com Lógica, dando-lhes força para enfrentar Os Desprovidos de Bom Senso.

Quem vencerá esta peleja, se morrer o Verde e vier a se apagar o Amarelo resplandecente do Sol ??!!

Conseguirão Os que Raciocinam com Lógica salvar a razão de ser da Esfera Azul !!??

Juracy de Oliveira Paixão (Abril de 2003).